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10.9.03

Governo matreiro

No Público:

As instituições de ensino superior ainda não sabem que orçamento vão receber do Estado, não sabem quais as implicações do aumento das propinas sobre as verbas que o Governo vai disponibilizar para acção social, sobre o montante das bolsas ou sobre o número de estudantes bolseiros e desconhecem como vai ser calculada a fórmula de financiamento. Neste cenário, o Conselho dos Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), reunido ontem, considera que não estão reunidas as "condições fundamentais para uma decisão sobre a fixação do valor das propinas, devendo recorrer-se aos procedimentos transitórios previsto na lei".

Ou seja, pede-se aos reitores que decidam as propinas sem saberem quanto é que o estado vai passar para as universidades. Isto é perverso e quase uma canalhice para os reitores. Por acaso serão os directores das faculdades (mais correctamente, os "senados e às unidades orgânicas com autonomia administrativa e financeira") a tomar esta decisão, mas a notícia é elucidativa do comportamento do governo. Analisemos então os incentivos de um decisor.

Sabe-se que o Governo está apertado em termos de contas públicas. Este, ao não divulgar quais os orçamentos das faculdades ou qual o impacto dos novos valores para as propinas nas verbas destinadas às universidades, quase obriga os decisores a escolherem a propina máxima. Porquê?
Imagine-se que o decisor escolhe a propina mínima. O governo terá legitimidade imediata para retirar fundos a essa universidade, numa lógica cínica de "esta não precisa". Se uma universidade teve oportunidade de recolher fundos próprios e não o fez, então só pode ser porque não precisa. A universidade que fizer isto no primeiro ano, certamente não o fará no ano seguinte. E a prazo, com base neste mecanismo do governo [que nem precisa de ser posto em prática, a ameaça da sua existência basta] teremos todas com propinas muito próximas do valor máximo.
Resta-nos assim um valor muito elevado. O curioso é que o incentivo a escolher este valor estará presente mesmo que o governo retire mais verbas às faculdades que o escolherem. Isto implicaria uma espécie de redistribuição regional ou por faculdade, que me parece algo ridícula. Mas, voltando aos pobres decisores, o facto de serem os primeiros a escolher (a jogar, se quiserem) obriga-os prever a reacção do governo. Como tudo aponta para uma retirada de fundos, as faculdades deverão acautelar-se e decidir pela propina máxima.
Vai ser um aumento brutal das propinas. Eu já acabei, mas tenho colegas que devem pagar 3 vezes mais por um semestre. É sem dúvida um passo para o auto-financiamento das universidades, o que nem me parece muito mal e parecia estar na agenda política do governo. Escusava-se é de o fazer desta forma, encostando as faculdades à parede e remetendo para estas decisões impopulares que o executivo estava mortinho por tomar. O senhor ministro parece ser muito esperto, mas espertos são os ratos. Há aqui espaço e condições para o tiro lhe sair pela culatra...