Telejornal. Tal como muitos portugueses, assisto com gosto ao minuto de parlamento do dia. Hoje vi Bagão Félix assanhado a refugiar-se na inteligência (ainda que tenha sido bastante burro), seguida de um: "vocês não querem ouvir". Realmente, o homem não tem muito jeito para aquilo, e aposto que perdeu o debate do dia para grande parte da população portuguesa.
Pior que tudo, perdeu contra uma Odete Santos que estava a lutar para construir uma frase que envolvesse uns quantos números que tinha apontados num papel. Foi penoso, mas finalmente conseguiu formular uma pergunta ao senhor ministro, acusando-o de mentir ao mesmo tempo. Vou ser simpático para Bagão Félix. A pergunta era estúpida. A acusação de mentira, só teria cabimento se a senhora Odete fosse mentecapta. Passo a explicar.
Falava-se de desemprego. Bagão terá dito (presumo... não vi hoje, mas já o vi a dizer noutras alturas), que o pior já passou, e que o número de novos desempregados tem vindo a diminuir. Terá tido a ousadia de dizer que as coisas estão finalmente a melhorar. Odete Santos pega por onde pode e pergunta ao ministro como é que as coisas estão a melhorar se o Eurostat diz que o desemprego em Portugal aumentou cerca de dois pontos percentuais.
Falavam de coisas diferentes. Era tão fácil desfazer o equívoco. Mas Bagão quis complicar. Não ajuda que quando fale pareça estar sempre na evasiva, por causa daquele estilo nervoso. De qualquer forma, Bagão passa a explicar que não tinha mentido não senhora, que ele tinha referido apenas a diminuição da segunda derivada (ou terá sido "um efeito de segunda ordem"? Se foi, é ainda pior...). Risos no parlamento. A minha mãe, ao jantar, faz uma careta. Mais risos no parlamento. Ouve-se Bagão a dizer "vocês não querem ouvir" e acaba a peça. Pouco depois expliquei à minha mãe o que era aquela coisa da segunda derivada (já agora, disse que era a aceleração do desemprego, isto é, que apesar do desemprego continuar a aumentar, aumenta cada vez menos).
Então, senhor Bagão? Ingenuidade? Estupidez? Cansaço de repetir sempre a mesma coisa? A verdade é que muita gente ficou com a ideia que mentiu realmente. Outros até acreditam que não tenha mentido. No entanto, como explicou usando um conceito que quase ninguém percebeu - nem os senhores deputados que até são doutores! - deve ter feito asneira da grossa. O facto da peça ter acabado logo de repente, também deve ajudar o equívoco.
Enfim, senhor Bagão. O senhor é um católico dedicado. Sempre que tiver que falar para um grupo de pessoas, lembre-se do seu Deus, e fale a linguagem das crianças. Aposto que gosta que Ele o faça. Sendo assim, só tem de fazer o mesmo aos outros. E sim, estou a falar de deputados e jornalistas, da criançada toda...